quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

ADEUS

       Ela havia ido embora. Não havia mais nada a fazer.
       Por vaidade, ela escondia o pior dela. Escondia seus defeitos, suas imperfeições, seus medos, suas angústias, suas fraquezas e tudo aquilo que ela não queria demonstrar. Mas ela sempre se arrependia, pois acabava se tornando a progenitora daquilo que odiava. Ela odiava criar expectativas alheias. Lapidada para ser diamante bruto, ela estava longe de ser perfeita e ele sabia disso, mas ele não se importava, apenas gostava dela.
       Por falta de respeito, as verdades dela eram a única coisa que cabiam no mundo, o mundo que ela criou e do qual fazia parte incondicional. Ela era cabeça dura... Mas ele via que ela tinha personalidade, que era autêntica, decidida, firme e tudo mais aquilo que ele queria ser, ou que ele precisava que estivesse ao lado dele.
       Por brutalidade, ela cuspia palavras ásperas e acabava machucando todos que estavam à sua volta. Era bruta flor. Por ser diamante bruto, ela não se deixaria lapidar pelas lágrimas do rapaz, pois ela havia sido lapidada para ser inquebrável.
       Por vergonha, ela nunca se deixava ser desvendada. Ela nunca havia se sentido tão nua como naqueles últimos meses e isso doía muito. Ela preferia que a despissem e que a vissem com os próprios olhos, pois acreditava piamente que isso doía menos...
       Mas nada disso adiantava mais. De tudo isso, restou apenas o último sorriso e a explicação breve de que ela não o queria mais. A explicação breve fez com que ele demorasse a processar a informação. Ele sabia que ela era decidida e que não ficou vermelha como ele no início do namoro. Ela não vacilou, não sorriu nem demonstrou fraqueza. Ela era realmente forte e ele lamentavelmente fraco.
       Ela havia ido embora. O que se havia de fazer?
Talvez ela realmente não tivesse ido embora. Estar longe não significava necessariamente que ela não se sentisse perto. Ninguém sabe, exceto aquele a quem a dor escolhe, o que é sentir-se nu de fragilidade exposto a todos os gritos de agonia da alma, agora tão só. Ser Bruta Flor não significa que as pétalas não lhe faltem e que os espinhos não lhe machuquem. O adeus breve talvez fosse apenas por ela pensar que clareza e poucas palavras doessem menos.
Não doem.
       As lembranças constituem aquilo que somos. O passado nunca nos abandona de fato, pois apesar de não sermos os mesmos a cada dia, não excluímos aquilo que nos tornamos, porque enquanto houver lembranças e sentimentos saberemos quem somos. Ele havia se transformado na memória mais colorida. E quando ela lhe pedia um sorriso, era para guardar decorado... Para que quando fechasse os olhos pudesse não só vê-lo como senti-lo. Com alegria, fechava os olhos. No entanto, cada pulsar de memória que agora lhe chegava era aflição aguda em seu corpo desejoso por lágrimas que não existiam.
Por fraqueza, não chorava.
O que ela era talvez estivesse perdido em alguma esquina anacrônica de seus pensamentos. Não havia mais proteção na madrugada que lhe tornava vazia. Não havia alívio para a dor tão abstrata do outro que lhe flechava o seu sentir principal. Não havia força nas palavras. Não havia mais o jardim no pensamento e as frutas no coração. Por dentro, um verde morto.
Pequena em seu ser, sorria para não se revoltar. Quando se sabe, mesmo que pouco, do que virá, alivia. Da mesma forma que quando se sabe, mesmo que pouco, do que será, dói! O futuro acabou se tornando o seu espinho mais incômodo. Sabia que teria que se resignar, mas gritava aos segundos do tempo que este não lhe parecia mais eterno. Seu silêncio vestido de calma, não passava de falta de ação frente ao seu vulcão fervilhante de sentidos cortantes.
Por fraqueza, não sabia demonstrar que eram sentimentos.
Com desgosto fechava os olhos para ter certeza aflita que não lhe pertencia mais senti-lo.
No final, o mais frágil dos seres. Aquela que não soube dar adeus.


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